A plataforma Prime da Amazon decidiu recriar a vida política de uma das figuras mais controversas da história recente: Carlos Saúl Menem. E o fez a partir de uma perspectiva efetiva, onde qualquer pessoa pode assistir à série.
Somente agora, pouco mais de quatro anos após sua morte, Carlos Saúl Menem, ex-governador de La Rioja e duas vezes presidente da Argentina, pôde ser avaliado com alguma objetividade.
O fato é que, durante sua administração, ele foi o homem forte do peronismo e, portanto, a subserviência de grande parte do establishment político estava a seus pés. Depois, veio a década e meia de governos kirchneristas, durante os quais sua figura foi vilipendiada ao extremo, no contexto de uma narrativa de neoperonismo de esquerda.
Desde que chegou ao poder, Javier Milei está determinado a resgatá-lo, mas seu estilo é muito diferente, assim como sua estrutura de poder. A questão é que, ao longo dos anos, sua imagem e administração estão começando a ser analisadas com mais imparcialidade e interesse próprio. Até julho de 2025, o sobrenome Menem não será mais sinônimo de poder absoluto, nem de palavrão.
Nesse contexto, surge a série sobre sua vida política.
Talvez o maior sucesso da série da Amazon Prime seja a abordagem humana a um personagem cujas administrações tiveram tanto sucesso quanto medidas repreensíveis. Só um tolo poderia negar, por exemplo, como a privatização melhorou a vida dos argentinos ou que vários atos significativos de corrupção foram tramados em torno dele. Para quem consegue lidar com ambos, a produção é, no mínimo, tolerável.
Isso, que pode parecer algo insignificante, não é pouca coisa, considerando a controvérsia histórica em torno da figura do líder riojano. Pessoalmente, gostei, mas isso faz parte do aspecto subjetivo. O que é moderadamente objetivo é o limite mínimo garantido para o espectador médio.
Evitando o menemismo e o antimenemismo, a história nos permite espiar pela fresta da porta da Casa Rosada e da Quinta de Olivos o que poderia ter acontecido naqueles anos. Mesmo antes do bem retratado conflito interno contra Cafiero, quando Menem garantiu a nomeação do Partido Justicialista para as eleições de 1989.
Não fica claro que isso seja ficção, mas muitos dos eventos descritos guardam alguma semelhança com a realidade. Por exemplo, a vitória inesperada nas eleições internas peronistas contra um rival mais poderoso ou a tentativa apressada e improvisada de avançar com o necessário processo de privatização.
Nesse contexto, os personagens coadjuvantes (não tão coadjuvantes), como Zulema Yoma e María Julia Alsogaray, são bem interpretados por seus atores e pela produção geral. Por exemplo, a ambiguidade da relação entre a filha do fundador da Ucedé e o ex-presidente é capturada na tela, deixando o espectador se perguntando o que realmente poderia ter acontecido, como muitos do círculo íntimo se perguntavam na época.
Seus críticos podem dizer que os aspectos negativos desse processo político são banalizados dentro da estrutura de um personagem que, apesar de suas falhas, ainda assim exibe seu lado sedutor, assim como o Menem original. Seus apoiadores também podem pedir mais, como um possível flashback, que poderia ter sido mostrado quando ele assinou os perdões para os militares. Esse segmento poderia facilmente ter sido complementado por um flashback de quando o próprio Videla o aprisionou em 1976 e até o impediu de comparecer ao funeral de sua mãe. No geral, a simplificação da ficção acaba sendo bastante neutra.
Basicamente, é um trabalho para cada um tirar suas próprias conclusões, assim como aconteceu com seus dez anos de mandato e seu legado. Quando confrontado com a pergunta inevitável, você pode assistir; como diria Carlos, “não vai te decepcionar”.