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Comportamento

A revolução das três divindades: Mamon, Eros e Bhios

Na era pré-cristã, como explica-nos Eric Voegelin, as antigas sociedades cosmológicas e helênicas tinham como prática o culto e adoração à deuses mitológicos. Fazendo com que houvesse uma mistificação e união da ordem social com a ordem cosmológica. Nas antigas tribos e monarquias primitivas, como na Macedônia pré-helênica, tornava-se comum que o culto aos deuses pagãos fosse concentrado na figura dos reis e da antiga aristocracia. Eram absolutistas e literalistas nas estruturas de poder como verdadeiras divindades imanentes.

A Weltanschauung cosmopolita – que atualmente tratamos na simbólica globalista – tem sua ascensão com Aristipo (ca. 435-365 a.C.), o primeiro psicólogo que busca oferecer uma explicação motivacional para os atos humanos. Contudo, para Aristipo, o motivo fundamental da ação humana é o prazer (hedone). Diferentemente de Sócrates e Platão que já defendiam uma visão de mundo substancial, objetiva e racional de que os laços dos indivíduos são espiritualmente amarrados.

Em encontro com Aristipo – o psicólogo hedonista – temos Epicuro (341-270 a.C.) que, fazendo contraste com a Academia e o Liceu de Platão e Aristóteles, instrumentaliza todo um pensamento de fuga da realidade concreta e num psicologismo da paz social mediante os prazeres. Para Epicuro, o materialismo de Demócrito explicava que o ser humano enquanto ser não tem nenhum sentido transcendente. O que ele pode fazer é aliviar suas dores mundanas e fugir delas o máximo possível. Afinal, sua alma não irá de encontro à eternidade. E os deuses não possuem o menor contato conosco, pois estão sempre numa condição de pura tranquilidade e indiferença. A escola epicurista visava implantar a ataraxia, ou seja, a pura e simples paz de espírito.

Naturalmente que a visão aristipiana-epicurista repousa num certo esvaziamento de todo contato contingente com a realidade e, por um processo subjetivista extremo, busca encontrar o resquício da divindade que aprisionou-se em nós. O trio Demócrito, Aristipo e Epicuro podem ser caracterizados gnósticos no sentido estrito do termo.

Portanto, a realidade sendo um fardo completo para o homem pois à luz da razão natural não pode-se encontrar a Verdade, é necessário, através dos processos meramente idealísticos e subjetivos superar este gigantesco fardo e libertar-se da prisão que nos fora imposta. Para tanto, três “divindades” fazem-se presentes: Eros, Bhios e Mamon.

Eros, divindade caracterizada pelas paixões sensíveis¹, é caracterizado por uma eterna juventude e pelo idealismo das paixões mais baixas. Hesíodo, em sua Teogonia, considera-o filho do Caos. E por qual motivo? Porque, para Eros, não há ordem do Ser e ordem do conhecer, hierarquia de bens e potências, etc. Só há paixões e desprendimento da realidade.

Bhios, já é tratado mais modernamente pelo mito do Cientificismo e do panteísmo. A divindade diluída tanto na natureza como no homem. O encontro literal entre o ser humano e a natureza mediante o otimismo e o progresso técnico para o encontro final com à Divindade Primordial.

Explica-nos o prof. Orlando Fedeli em seu “Antropoteísmo – a Religião do Homem”:

“A escatologia panteísta é otimista: o Deus que se transformou no mundo alcançará de novo o primitivo estado de perfeição. Por meio da evolução, tudo caminha para uma perfeição cada vez maior. O homem, redentor do universo e de si mesmo, pela sua razão, pela ciência, pela técnica, eliminará todos os males e todas as limitações que nos afligem e construirá, na terra, o paraíso. O Panteísmo é, pois, progressista e utópico.”

Mamon, divindade muito tratada pela Literatura Cristã em especial, aparece nas Sagradas Escrituras para descrever a cobiça e à riqueza material. Há, num texto áureo da Bíblia no Evangelho de São Mateus 6-19, 24:

Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam mas ajuntai para vós tesouros no céu, onde nem traça nem ferrugem corroem e onde ladrões não minam nem roubam: Para onde está o teu tesouro, aí estará o seu coração também. Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou há de odiar um e amar o outro ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.”

E uma citação no Evangelho de São Lucas 16, 13:

Nenhum servo pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer a um e amar ao outro, ou há de unir-se a um e desprezar ao outro. Não podeis servir a Deus e as riquezas.”

 

Para Johann Wolfang von Goethe, em seu poema trágico intitulado Fausto, Mamon é tratado como “Ouro” e “Entidade Demoníaca”.

A síntese dessas três Divindades – como retratam às Sagradas Escrituras os deuses pagãos são demônios – simbolicamente tratadas explicam toda nossa vida contemporânea.

A busca incessante por paixões desregradas para a fuga da realidade concreta, a preocupação demasiada histérica da perfeição da saúde e do progresso para o encontro com a Mãe Natureza e a ganância desenfreada pelos bens materiais.

Todas essas três formas de ilusões e vaidade, como retrata bem os textos de Eclesiastes, dão o total embasamento para o movimento revolucionário da atualidade.

A beleza, a ordem, a unidade, a verdade, a bondade foram rebaixados de seu caráter transcendental para o relativismo pueril. O homem, rebaixado de sua verdadeira nobreza, sendo tratado como mero saco de compostos bioquímicos-fisiológicos, atomizado pelas circunstâncias das inúmeras revoluções históricas, vendeu por trinta moedas o bom senso comum por utopias cada vez mais trágicas e absurdas.

É evidente que as paixões, a saúde, a natureza e o dinheiro não são maléficos em si. Assim como não são princípios. Todos esses meios para obter coisas boas devem ser balizados pelo bem e pela reta justiça. Pois já dizia o Apóstolo S. Paulo em Romanos 13 que não há nenhuma potestade que não tenha vindo de Deus. Portanto, todo poder emana de Deus e não puramente dos homens para que façam aquilo que lhe der na telha sem prestar contas ao Altíssimo.

Para que uma sociedade perca toda direção da Ordem e do Bem, foi preciso ter perdido toda hierarquia do Amor. Já dizia Ortega y Gasset que amar é uma vivificação perene, não uma mera paixão passageira que visa apenas a boa saúde e o dinheiro, mas que repousa seu Ser na continuidade da eternidade. Apenas uma pessoa que ama verdadeiramente outra pessoa pode entender, pela experiência, que o ser amado transporá todo período histórico e trágico. E, com isto, todas as suas paixões e desejos repousam na Bem-aventurança do ser amado e não nos prazeres passageiros.

Assistimos a humanidade amedrontada e vazia de sentido após ter crido nas falsas promessas das três divindades aqui apresentadas simbolicamente. Uma pandemia, o indiferentismo das relações interpessoais e o desespero da escassez financeira fizeram com que entregássemos tudo aos principados e potestades deste mundo e apenas deste mundo. Esquecemo-nos daquilo que é essencial para contentarmo-nos com migalhas dadas pela Elite satânica.

Até mesmo Sacerdotes – casta essencialíssima para esses tempos – que deveriam analogamente viver como Cristo neste mundo cospem em sua vocação para adorarem, mesmo inconscientemente – às três divindades e sua revolução cosmopolita. Suspendem Missas, Sacramentos, impedem a presença de fiéis necessitados da Casa de Deus para agradarem os deuses deste vale de lágrimas.

Tudo isto faz-me lembrar, como um ato intuitivo, da Oração de São Miguel Arcanjo: os demônios que andam pelo mundo para perder as almas.

Entretanto, para muitos desses Sacerdotes, políticos, etc., não há alma. Somos apenas átomos soltos batendo cabeça em busca de prazeres e ganhos materiais. Somos como Maquiavel justificando os meios pelos fins.

Nossa miséria intrínseca não necessita mais da Graça e das virtudes, mas dos vícios e do contentamento da ilusão de nos bastarmos por si próprios.

Por este motivo, como bem diz Olavo de Carvalho, o movimento revolucionário caracteriza-se pela inversão de sujeito e objeto. E complemento-o que, após a inversão, aparece a romantização mítica e mística dos deuses deste mundo.

Sim, caro leitor, parece uma bobagem infantil – quando percebido o contraste entre aquilo que somos e o que buscamos como fim no mundo contemporâneo – o que a humanidade faz de si mesma no século da superação humana. Mas que superação é esta que dura apenas alguns momentinhos toscos e pueris? Que superação é esta que depende de uma macroestrutura internacional? Que superação é esta que nos faz reféns de poucos indivíduos e que saímos gratos pelas migalhas que vem de cima? Ora….

Que nos libertemos da hipnose aplicada pela Tripla Divindade mundana ou perderemos tudo aquilo que mais importa: a visão essencial do verdadeiro Deus.

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